Carta de uma adita à recuperação.

Querida Recuperação,

Ontem, num fugaz instante de memória, vieste-me ao pensamento. Faz algum tempo que não te escrevo, e sendo tu a minha melhor amiga, quis te fazer este louvor.

Há amizades que salvam e nos arrancam a um caminho que desembarcaria na morte, caso tu, querida amiga, não te tivesses dado a conhecer na minha vida.

Desconhecia este caminho de hoje, um novo caminho que se revelou, nunca diria fácil, mas recompensador e gratificante.

Ainda muito tenho por aprender, mas foi essa a principal dádiva que me deste: a de saber que aquilo que penso saber pode não ser o melhor para mim. Saber refletir, partilhar e entregar.

Foste a primeira no meu caminho que me fez sentir Amor. Amor, principalmente por mim.

Que a crença profunda que não somos capazes ou não temos valor, foi o primeiro impulso dessa corrida destrutiva a que um dia me entreguei cegamente, com a alma doída e o coração desencontrado. Desenganado. Desencantado. A vida é plena e tantas vezes não acreditei. Chegaste num momento de dor. Penso mesmo que dentro de mim, nessa altura, já nem cabia mais um grama de dor. Toda eu pesada dessa dor de que ninguém me conseguia arrancar. A Luz que chegou contigo fez-me acreditar.

Estava finalmente preparada para escolher um novo caminho. Contigo tudo mudou. A família, o meu percurso académico, as minhas relações com os outros e acima de tudo, a relação comigo mesma. As dificuldades mantêm-se pois a vida é feita assim para todos nós. O que alterou foi a forma de as enfrentar e superar. O poder da mente tem muita força. O poder do coração é o motor central da vida.

A ti, amiga, tudo devo. Não posso esquecer nunca o motivo porque existes na minha vida: no dia que te esquecer, voltarei ao peso daquela mesma dor na qual me encontraste naquele dia que não esquecerei.

Companheira de estrada, carrego-te comigo mesmo que de ti não fale. És presença constante e gostaria muito de te saber eterna em mim. Mas esse é o meu papel: manter-te acesa na minha vida.

Sei que, enquanto aqui viveres, a chama não apagará. A chama da recuperação e da vida.

De uma adita em recuperação.