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Carta à família.
Não há outra maneira de começar esta carta sem ser com um obrigado.
Obrigado pai. Obrigado mãe. Obrigado mano. Obrigado avós!
Sem cada um de vós, e sem o vosso amor, a esta hora provavelmente estaria morto ou, na melhor hipótese, a viver miseravelmente numa rua qualquer, numa cidade qualquer para onde a minha doença me teria levado.
O vosso amor permitiu renascer em mim o ser humano que veio ao mundo, nu, na simplicidade que se quer da vida.
A minha dependência de drogas trouxe-me ao ponto que estou hoje, um ser humano que precisou de perder tudo, principalmente a sua dignidade, para dar valor a tudo o que se diz pequeno, mas que tem tanto valor. A paz com que acordo de manhã, sem ter que pensar onde vou arranjar dinheiro para consumir e conseguir funcionar minimamente como gente, é das coisas mais revitalizantes que vivo todos os dias.
O brilho no teu olhar mãe, que existe novamente desde que te restituí a confiança e serenidade. Não há palavras que o descrevam... nunca esquecerei o olhar que outrora te provoquei, de dor e angústia. É um memorando do quanto te magoei, de um lugar onde nunca mais quero voltar. E é tão bonito esse teu renascido e novo olhar, de amor e de aconchego.
O meu pai, que entretanto partiu, sei que neste momento deve sentir orgulho em mim. Fizeste o teu melhor Pai, deste o teu melhor, infelizmente muitas vezes não o soube entender. Resta-me o conforto de saber que quando morreste já me viste em recuperação e a lutar dia após dia pela minha sobriedade.
A ti meu irmão, nunca fomos de grandes conversas, mas ambos sabemos que estamos lá um para o outro. Não sei o que sentiste ao longo de tantos anos a ver-me destruir a minha própria vida. Desculpa a minha frieza e distância, que só consegui combater quando comecei a querer dar os primeiros passos rumo a mim mesmo.
Aos meu queridos avós... as palavras são poucas para tudo o que sinto. Espero que agora tenham orgulho na pessoa em que me tornei, tento ser digno do nome e da herança genética que possuo. Sempre me ensinaram o que ela é, sempre vincaram que o grande bem que temos é a nossa palavra e a nossa honestidade. Hoje, tento conduzir a minha vida com todos esses valores reaprendidos.
E são estas pequenas grandes coisas que hoje me fazem feliz e sentir-me completo. Os sorrisos nos olhares, a paz de espírito, a vossa confiança em mim, a nossa paz!
Nunca agradecerei o suficiente, por terem sido resilientes e fortes ao ponto de me dar o abanão que, mesmo sem saber, eu precisava! E, como naquele texto: "Pegadas na areia", por estarem verdadeiramente a pegar-me ao colo mais uma vez.
Quando a vossa porta se fechou e me vi obrigado a decidir o que queria para a minha vida, tudo se tornou evidente, no meio de sentimentos confusos, de abandono e raiva, tudo se tornou claro e tive provavelmente o pensamento mais sóbrio de toda a minha vida, e foi nesse momento que escolhi a minha família.
Obrigado por tudo isto família, por me terem ensinado duas vezes a andar, por me terem mostrado o caminho certo com todo o vosso amor. Amor firme, amor certo, que me obrigou a escolher o meu caminho. O caminho certo!
Texto anónimo de um adito em recuperação
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